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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Conseguem imaginar?


Não adoram que eu reclame da vida em Bucas? Então cá vai:
A boa disposição do pastel de nata não durou a semana inteira não. Lamento mas não foi suficiente.
Para já, as dores de cabeça voltaram, digam-lhes um olá. E voltaram em grande.
A mãe foi almoçar comigo e proibiu-me de passar na rua. Viu qualquer coisa que a deixou demasiado incomodada para conseguir passar lá de novo. Eu pedi para nem me dizer o que era.
A verdade é que já estive em sítios difíceis e, infelizmente, tenho lido imensas más experiências de outros INOVS, nomeadamente assaltos.
Mas a minha realidade agora é esta: Bucareste. E Bucareste deixa-me constantemente um mal estar enorme – os cheiros, as pessoas, as doenças na rua, o lixo, os cães com sarna, (as famosas baratas)...
Já estive em Macau ou Hong Kong. Sei que se não fosse a partida do destino, era lá que estaria agora e também teria um blog a dizer o quão estúpido era o meu chefe (sim, porque o que ia ser meu chefe foi realmente estúpido), o quão complicado era o cheiro a chinês, a humidade que não deixa secar a roupa, as amorosas baratas de novo, os empurrões dos baixotes, as cuspidelas sonoras, a toda a hora. A ida ao mercado e assistir ao assassinato do peixe ainda vivo. E de novo as cuspidelas, blerkh.
Já estive na Rocinha  e sei que se estivesse no Brasil ia ter um blog a dizer o quanto me impressionava a pobreza de certas pessoas, o medo que sentia dos moleques da rua, a surpresa pela falta de saneamento básico em casas mesmo ao lado de quarteirões de luxo.
Em Maputo ia chorar secalhar com a miséria das crianças, sempre a tentarem vender-me o artesanato mais ternurento, feito a partir de coisas encontradas no chão.
Na Tunísia ia estar louca com os tunísino sempre a tocarem-me e a aliciarem-me para tudo (por falar em tocar, continua a saga do toca-toca aqui no escritório: elas é os meus anéis, o tecido da saia, o colar... não há um dia que eu não ouça um comentário à maneira como estou vestida, acompanhado de um, por vezes distraído, roçar de mãos para avaliar o material. Até já descobri que comentam como eu venho vestida, assim que eu entro. Viva não perceber a língua romena).
Enfim, sei o quão complicado é viver num país diferente, sobretudo quando há graves problemas sociais.
Teria um blog com humor negro, estivesse onde eu onde estivesse.
Não me podem, ou não devem, considerar pessimista. Sou exigente é verdade, mas sobretudo sou atenta. Presto atenção a todos este pormenores. E sou extremamente sensível a certos pontos. Da mesma maneira que noto os defeitos, também sobressalto as qualidades.
Mas tenho feito mais sucesso quando vejo o lado negro das coisas.
A verdade é que é duro. Até a minha mãe que nessas coisas é dura comigo, e a quem eu baixei totalmente as expectativas relativas à cidade de Bucareste (atenção! Não ao país) agora consegue entender-me um pouco.
É interessante viver deste lado da Europa, perceber o quão longe estamos da realidade que conhecemos, claro que sim. Mas tanto tempo, é duro. Vir de passagem, como vieram os meus primos o ano passado, ou este ano a Susana e o Pedro, e viver como eu vivo são duas realidades cruamente distintas. E o viver provisório também se distingue totalmente do vir para ficar. Quem vem com bons contratos e sabe que aqui irá ficar arranja defesas, escapes – como ter um carro, sair à noite, beber copos, arranjar uma mulher...
Já viram que já visitei quase toda a Roménia. De uma ponta à outra. Que fiquei encantada com a beleza das estradas, com a natureza, com as cidades pequenas. Mas onde está o brio deste povo? Cada lago, cada rio, cada jardim, cada espaço verde, é minado de lixo. Lixo ocasional, como beatas de cigarro ou latas de refrigerante. Puro descuido. O atendimento ao público, sempre feito com cara feia (ok, nem sempre, quando são simpáticos são muito simpáticos). E felizmente ainda não senti medo, talvez tenha tido sorte, mas nada nos aconteceu desde que cá chegámos. Mas conseguem imaginar o que é viver numa cidade que podia ser o Porto, com pessoas da foz e pessoas do bulhão, todos misturados a cirandar de um lado para o outro, mas que, apesar de muitos e de criarem uma confusão cosmopolita, não conseguem esconder a verdadeira miséria que vive aqui? Sem abrigo a dormir em TODAS as ruas onde passamos, sempre algum a vasculhar um caixote do lixo (acreditem, eu sinto-me mal quando ponho o meu verdadeiro lixo no lixo, porque sei que alguém irá mexer naquilo...não sei mesmo como fazer para o evitar. Já cheguei a usar estratégias de meter um saco com as coisas mais porcas dentro do saco do lixo com restos de comida, ou embalagens). Doenças, miséria, choros, lamentos, olhos vidrados no vazio, pessoas que se chegam a nós. Uma insanidade constante por todo o lado.
Conseguem imaginar?

2 comentários:

  1. Consigo completamente. A verdade é que é duro, como dizes. Confesso que quando estavamos (sorry pelos acentos, o teclado é francês) para saber os nossos destinos, so pensava "roménia não, roménia não!". E a verdade é que tudo o que aqui escreves confirma as ideias pré concebidas que eu tinha sobre esse pais. Não é que a Tunisia seja espectacular - quer dizer, é uma optima experiência, o clima é bom, ha praia, é barato, etc. - mas a verdade é que, mesmo não querendo ser picuinhas, não ha nada como a limpeza do nosso pais (e de outros ocidentais, claro). Mesmo assim, insistem em dizer-me, quando reclamo desta nojeira que estas pessoas fazem à sua volta "ahh mas Portugal era assim ha 30 anos!". Whatever, ja nao é - e eu nunca o conheci assim, tão atrasado. Por isso, é normal que nos choque. Os nossos padrões são mais elevados, e convenhamos, ninguém me mete na cabeça que humanos & baratas foram feitos para co-habitar..

    Bom post!

    Kisses from Tunisia ;)

    Catarina Rosa

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  2. A minha mãe diz que um turista devia sentir certas coisas parecidas com isto em Portugal antes do 25 de Abril. Mas sim, nós nunca vivemos nada assim, e incomoda, por muito aventureiras e corajosas que sejamos! Eu não entendo quem vive aqui e nada faz para "arranjar" o país... mas eu sempre e soube e agora mais que nunca VIVA PORTUGAL.
    Adoro viver pelo mundo, mas onde gosto de voltar é para lá.

    Beijo Cat!!

    Sarucha

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